O sistema de plantio direto, cultivo mínimo, cobertura viva e morta são práticas importantíssimas na agricultura catarinense, devido ao tipo de solo predominante, utilização inadequada do solo, especialmente em áreas de altitude e, diversidade climática, onde se verifica a ocorrência de chuvas freqüentes e torrenciais e elevada incidência de luminosidade solar. Na produção de hortaliças, o sistema de cultivo afeta diretamente a sustentabilidade da atividade, principalmente por influenciar nos aspectos químicos, físicos e biológicos do solo, ciclos de nutrientes, e, na vida vegetal, animal e dos microrganismos. Assim, considerando que os solos catarinenses estão sujeitos a processos de erosão, aliado a baixos teores de matéria orgânica, as práticas de plantio direto, cultivo mínimo e cobertura morta são fundamentais, principalmente no cultivo de hortaliças que se caracterizam pelo ciclo rápido, uso intensivo do solo, insumos e práticas culturais.
Outra vantagem dessas práticas é o fato de o solo estar sempre preparado para semeadura/plantio, mesmo em períodos chuvosos, que não permitem o revolvimento devido à umidade excessiva. Para o plantio direto ou cultivo mínimo, basta fazer uma roçada utilizando uma foice ou roçadeira manual para áreas maiores e abrir as covas ou sulcos.
.Plantio direto: é um método de plantio que não envolve nenhuma preparação do solo, ou seja, apenas é feito uma pequena cova com o propósito único de colocar a semente ou muda na profundidade desejada. Nesse caso, a camada de cobertura vegetal é mantida nas entrelinhas e entre plantas. É um plantio conservacionista que pode ser utilizado no cultivo orgânico de hortaliças. Muitas pessoas acreditam que o plantio direto está necessariamente vinculado ao uso de herbicidas, o que não é verdade.
.Cultivo mínimo: é a mínima manipulação do solo necessária para a produção das culturas. Também neste sistema deixa-se uma considerável quantidade de cobertura na superfície (resíduos culturais), especialmente nas entrelinhas. O cultivo mínimo de hortaliças é uma prática que pode ser associada ao manejo de plantas espontâneas e plantas de cobertura, especialmente nas espécies em que se utilizam espaçamentos maiores entre linhas tais como na batata-doce e nas espécies pertencentes as famílias das cucurbitáceas, brássicas e solanáceas. Nesse caso, são abertos pequenos sulcos que são adubados para posterior semeadura ou transplante de mudas, deixando-se nas entrelinhas as plantas espontâneas ou plantas de cobertura. Posteriormente, por ocasião da primeira adubação de cobertura, em algumas espécies, é feita a amontoa e, quando necessário são feitas roçadas nas entrelinhas e arranquio das plantas espontâneas na linha para evitar a competição por luz, nutrientes e água. O consórcio de adubos verdes (aveia – 60kg/ha + ervilhaca – 18kg/ha + nabo forrageiro – 4kg/ha) é também uma ótima opção para melhorar a cobertura do solo, promover o efeito benéfico no manejo de plantas espontâneas, aprimorar a eficiência na ciclagem de nutrientes(fornecendo nitrogênio e reciclando nutrientes) e na descompactação do solo e ainda permitir o cultivo mínimo de hortaliças (Figura 1).
Figura 1. Cultivo mínimo de tomate tutorado e milho-verde em cobertura de aveia + ervilhaca+ nabo forrageiro.
. Cobertura morta - é a palhada disposta sobre o solo para a realização do plantio direto ou do cultivo mínimo. Essa prática consiste na colocação de 5 a 10 cm de palha (Figura 2) ou casca de arroz, capim ou palha seca de milho (Figura 3) e outros materiais como bagaço de cana nas entrelinhas das hortaliças cultivadas em espaçamentos maiores. A obtenção da cobertura morta pode ser feita de duas maneiras: pela importação de palhada de outra área e pelo cultivo de plantas de cobertura, fornecedoras de palhada, e seu manejo (corte) no próprio local. Há inúmeras espécies que podem ser utilizadas para produção de cobertura morta, tanto em cultivo “solteiro” como no consorciado. Espécies de adubos verdes, sejam leguminosas, gramíneas ou plantas de outras famílias, podem ser utilizadas como plantas de cobertura morta. A mucuna, isoladamente ou consorciada com milho (Figura 4), semeados em novembro ou dezembro, produz grande massa verde no verão e pode ser utilizada como cobertura morta, através do corte ou ainda pela secagem natural devido ao frio, no inverno visando o plantio direto de hortaliças a partir de julho/agosto. As leguminosas,encontradas em grandes diversidades de clima e solo, são consideradas ótimas para adubação verde por serem ricas em nitrogênio e possuírem raízes ramificadas e profundas. A cobertura morta mantém a superfície do solo sem a formação de crosta superfície endurecida), evita a evaporação da água da chuva ou da irrigação, reduz a erosão em solos inclinados, diminui a temperatura do solo no verão e,principalmente, economiza capinas devido à menor incidência de plantas espontâneas.
Que hortaliças podem ser cultivadas no sistema de plantio direto e no cultivo mínimo, utilizando cobertura morta ou viva? basicamente, podem ser cultivadas nestes sistemas de plantio todas as espécies plantadas em espaçamento relativamente aberto, o suficiente para permitir capinas nas linhas de plantio e, sempre que for necessário, roçadas nas entrelinhas. Hortaliças pertencentes às famílias botânicas das solanáceas (tomate, pimentão e berinjela) cucurbitáceas (abóbora, abobrinha, moranga, pepino, melão e melancia) e brássicas (repolho, couve-flor, brócolis e couve), além do feijão-vagem, milho-verde, aipim, batata-doce, morango, entre outras.
Figura 2. Plantio direto de mudas de couve-flor sobre cobertura morta de palha de arroz.
Figura 3. Plantio direto de mudas de repolho sobre cobertura morta de palha de milho.
Figura 4. Milho-verde e mucuna consorciados, semeados em dezembro: ótima opção para adubação verde, rotação de culturas, manejo de plantas espontâneas e ainda utilizadas como cobertura morta para o plantio direto de hortaliças no final do inverno.
A produção de hortaliças é, geralmente, atividade intensiva com sistemas de produção baseados em intensa e frequente mecanização e na utilização intensiva e crescente de insumos. Em muitas regiões de produção de olerícolas e, especialmente em áreas montanhosas com topografia acidentada, os processos erosivos e o esgotamento dos recursos naturais são alarmantes, além do agravamento dos problemas fitossanitários decorrentes de um ciclo de empobrecimento crescente.
Já consagrado na produção de grãos pelos benefícios que proporciona, sendo utilizado em mais de 22 milhões de hectares, o Sistema de Plantio Direto (SPD) é importante ferramenta para a obtenção de sistemas produtivos mais sustentáveis também na produção de hortaliças.
O Sistema de Plantio Direto em Hortaliças (SPDH) segue três princípios básicos: o revolvimento localizado do solo, restrito às covas ou sulcos de plantio; a diversificação de espécies pela rotação de culturas, com a inclusão de plantas de cobertura para produção de palhada; e a cobertura permanente do solo.
Dentre os benefícios do SPDH, destacam-se a redução nas enxurradas em torno de 90% e nas perdas de solo em torno de 70%, minimizando processos erosivos; a economia de água em culturas irrigadas em até 30%; a diminuição na mecanização em até 75%; a regulação térmica proporcionada pela palhada com redução dos extremos de temperatura em até 10ºC na superfície do solo; incremento nos teores de matéria orgânica e maior ação biológica de minhocas e outros organismos; a menor dispersão de doenças, pelo não revolvimento do solo e redução de enxurradas e respingos; e a redução nas capinas pela barreira proporcionada pela palhada para as plantas infestantes. Tem-se observado que, em função da preservação ou recuperação da qualidade do solo, os níveis de adubação têm sido diminuídos sem prejuízo na produtividade de lavouras.
O fato de o sistema de plantio direto promover aumento nos estoques de carbono do solo, bem como uma possível redução das emissões de gases de efeito estufa, fazem dele uma importante ferramenta de mitigação das mudanças climáticas globais. Além disso, o papel do SPD na redução da temperatura do solo, dos processos erosivos e da necessidade de uso de agroquímicos, além da manutenção de maior umidade, sem, contudo, promover o acúmulo excessivo de água, mostram o poder dele de promover a adaptação dos sistemas produtivos agrícolas aos impactos das mudanças ambientais em curso, especialmente aquelas relacionadas ao clima. Os benefícios da adoção do sistema de plantio direto citados fizeram com que este fosse incluído no rol dos sistemas de produção preconizados pelo Plano de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (Plano ABC) do Governo Federal. Tal plano prevê uma série de incentivos para produtores que utilizem a tecnologia e tem como meta o aumento, até 2020, de 8 milhões de hectares das áreas agrícolas em SPD.
Para a adoção do SPDH, deve-se considerar que as hortaliças, em geral, não proporcionam resíduos de palhada em quantidade adequada à manutenção do sistema, devendo-se incluir plantas de cobertura na sucessão de cultivos com as hortaliças. Entende-se por plantas de cobertura espécies com elevado potencial de produção de matéria seca e com profundo e vigoroso sistema radicular que têm a capacidade de reciclar nutrientes e de, após sua decomposição, tornar o solo leve e poroso promovendo bom enraizamento do cultivo subsequente. Cabe lembrar que as plantas de cobertura, a exemplo de milho, trigo ou sorgo, podem ser culturas comerciais. Sugere-se como planta de cobertura o uso de gramíneas, preferencialmente consorciadas a leguminosas e outras espécies.
Após o manejo das plantas de cobertura por trituração, corte, acamamento e/ou dessecação, efetua-se o plantio, no caso de sementes, ou o transplante de mudas das hortaliças.
Faz-se necessário ajustar o manejo da irrigação, considerando o efeito da palhada sobre o solo, e da adubação, considerando a decomposição dos restos culturais das plantas de cobertura.
As primeiras experiências com plantio direto de hortaliças no Brasil, de forma mais sistematizada, foram em cebola, no estado de Santa Catarina, ainda na década de 80. Hoje, há diversas iniciativas Brasil afora. Ocupa atualmente cerca de 50% da área do tomate para processamento, 20% de abóbora híbrida e 10% de cebola no país.
A Embrapa Hortaliças, sediada em Brasília, Distrito Federal, desde 2002 tem conduzido experimentos para sistematizar o SPDH em cebola, tomate rasteiro (para processamento) e tomate envarado (para mesa), brássicas (repolho, couve-flor e brócolos), abóboras e outras hortaliças, com avaliação de diferentes cultivares e plantas de cobertura, níveis de adubação, manejo da irrigação, entre outros fatores. Foram implantadas unidades demonstrativas em diversas regiões, sempre em parceria com a iniciativa privada, com organizações de agricultores e órgãos de extensão rural.
Destaque especial deve ser dado ao SPDH no que concerne à Agricultura de Montanha, em vista das fragilidades e das limitações nesses ambientes, haja vista a tragédia ocorrida em 12 de janeiro de 2011 na Região Serrana do Rio de Janeiro, com enxurradas violentíssimas que foram potencializadas pelo modelo agrícola utilizado. Dando continuidade ao trabalho, acaba de ser aprovado um projeto para capacitação de multiplicadores (técnicos e agricultores líderes) e promoção da adoção do SPDH em ambientes de montanha da Região Sudeste. Faz-se importante aqui lembrar que, para ambientes muito declivosos, é possível que seja necessária a adoção do SPDH consorciado com outras práticas de conservação do solo, como o terraceamento, por exemplo.
É indispensável buscar alternativas para o desenvolvimento de modelos de produção de hortaliças mais amigáveis ao meio ambiente, com viabilidade econômica e sustentabilidade ambiental, adequado às condições edafoclimáticas tropicais. Finalmente, o SPDH deve receber ajustes conforme as realidades locais, podendo ser desenvolvido nos mais diversos ambientes ou realidades socioeconômicas.
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